[CURTAS] Ex-desenvolvedor da RARE fala dos desafios da criação visual de Donkey Kong Country

Uma parceria bem acertada entre uma desenvolvedora britânica e uma gigante japonesa acabou por gerar um dos maiores clássicos da história dos videogames. A união da RARE com a Nintendo em 1994, que criou Donkey Kong Country, o segundo título mais vendido para o Super Nintendo, com mais de 9 milhões de cópias vendidas, surgiu quando os irmãos e fundadores da RARE Chris e Tim Stamper resolveram investir em potentes supercomputadores chamados Silicon Graphics, capazes de gerar gráficos pré-renderizados.

Essas máquinas já haviam sido usadas em jogos do tipo boxe, que nunca foram lançadas, mas acabaram despertando o interesse da Nintendo. Durante uma entrevista ao site Nintendo Life, o ex-funcionário da RARE Brendan Gunn aproveitou para falar sobre o assunto:
Funcionários do alto escalão da Nintendo nos visitaram na época em que este game de boxe estava sendo feito, e ao ver aquilo fecharam o acordo. A Rare mostrou a eles esta demo em construção com gráficos renderizados, que hoje em dia provavelmente não impressionariam, mas na época as diferenças eram gritantes em comparação a outros games.

Após o projeto do jogo de boxe não ter avançado, os irmãos Stamper pediram à Nintendo para trabalhar em um jogo que estrelava o gorilão engravatado. E assim iniciou o desafio de renderizar os gráficos de Donkey Kong Country:
A renderização de cada modelo 3D levaria anos. Nós trabalhávamos até às 11 horas da noite, íamos para casa, e de manhã a imagem talvez tivesse acabado de ser renderizada - levava todo esse tempo para as máquinas executarem esta tarefa. Tínhamos uma massiva unidade de ar condicionado só para refrigerar estas máquinas SGI. Podíamos estar sofrendo no verão, mas contanto que o computador não superaquecesse, isso não importava.

Eu me lembro da primeira vez que vi o modelo renderizado de Donkey Kong na tela, e me pareceu uma coisa real, sólida. Nos velhos tempos, as coisas costumavam ser desenhadas à mão no papel, alguém tinha de desenhar uma grade sobre elas e decodificá-las manualmente, então a renderização economizou um pouco de esforço.

Gunn revela que, apesar do gênio Shigeru Miyamoto já ter em mente um esboço da aparência de Donkey Kong, a equipe da RARE seguia os comandos dos irmãos Stamper. Eles davam liberdade para que os desenvolvedores testassem novas ideias, porém com a pressão de melhorar tudo o que fizessem. Isso ficou evidente com a clássica guerra dos consoles entre a Nintendo e a Sega, o que motivou a equipe a criar um jogo que mostrasse a superioridade do Super Nintendo, mesmo ao saber que a concorrente tentava criar um jogo que usava o mesmo modelo de renderização:
Começamos a ouvir falar sobre outro jogo com um uniciclo. Falavam que ele tinha gráficos pré-renderizados, e havia aquela preocupação de que estivessem fazendo algo melhor do que nós. Acabamos descobrindo que apenas o uniciclo era feito com SGI. No nosso game, tudo era renderizado, até mesmo os números que mostravam a pontuação; não havia um único elemento desenhado à mão nesse game. Foi um grande alívio saber que a DMA não tinha nos superado nesse aspecto.

Apesar do enorme sucesso do primeiro jogo do gorila engravatado, Gunn se culpa por não ter tido tempo suficiente para trabalhar um detalhe: a movimentação dos kongs pelos mapas;
Quando você navega pelo mapa - que é finamente desenhado com caminhos levando a todos os lugares - acabei fazendo aquele sistema de navegação preguiçoso com pontos ligados por uma linha reta entre cada locação. Ele deveria ter seguido os caminhos em si na verdade. Mas nosso tempo estava esgotado. É algo que eu olho para trás e penso que não consegui fazer da maneira que queria.

Com a repercussão do sucesso de Donkey Kong Country, Brendan Gunn foi convidado para trabalhar no então Project Dream, mais tarde conhecido como Banjo&Kazooie, mas optou por desenvolver as sequências Donkey Kong Country 2 e Donkey Kong Country 3, além de se envolver na criação de Donkey Kong 64. Gunn não trabalha mais na indústria de jogos, mas finalizou a entrevista ao falar sobre a influência dos jogos antigos da Nintendo na equipe da RARE:
Olhávamos bastante para qualquer coisa que eles fizessem. Sempre que tínhamos um dilema em algum game, recorríamos a Mario e Zelda para nos guiar quando não tínhamos certeza de como abordar algo. Sinto que, mesmo que tenhamos feito um grande trabalho, sempre pareceu que estávamos copiando a Nintendo. Nós pegaríamos aquilo que eles fizeram, conduzindo levemente a uma nova direção. e trabalhando em cima disso tecnicamente e graficamente.

Eles foram uma influência enorme em tudo o que fizemos; não penso que houve qualquer competição. Se pudéssemos aperfeiçoar um conceito e torná-lo melhor em alguns aspectos, então ótimo. Atualmente, tenho certeza que muitas pessoas vão argumentar dizendo que a Nintendo produziu muitos games melhores -Goldeneye à parte, que indiscutivelmente teve um conjunto de influências totalmente diferentes - mas nós admirávamos eles, e queríamos colocar nossa marca nas coisas.


Via Reino do Cogumelo.
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